Escritores deixam livros

Escritores não morrem, escritores deixam livros

Quando eu era adolescente vivia no meu quarto lendo livros e minha mente vivenciava cada uma das histórias como se eu estivesse dentro delas e fosse muita amiga de quem as escreveu.

Uma das minhas paixões foi o Cortazar, que me fazia viajar em seu realismo mágico de personagens fantásticos que me acompanharam por muito tempo. Ele era um mestre e eu uma menina que pouco sabia dele, mas o imaginava próximo.

Outra paixão foi Jorge Luis Borges que me fez entrar em reinos profundos, com suas questões filosóficas, metafísicas, mundos onde a mitologia e a teosofia se abraçavam entre luz e sombras.  Um mundo de labirintos e túneis dentro da minha alma que queria se expandir e derrubar as paredes e amarras.

Esses autores maravilhosos eram a minha companhia, meus amigos invisíveis e por eles eu nunca me senti solitária.

Eles estavam por aí, em algum lugar do mundo, e quem sabe um dia eu poderia encontrar um deles.

Carlos Drummond de Andrade, Garcia Marquez, Mario Quintana, Cecília Meirelles, Clarice Lispector, Guimarães Rosa, Rubem Fonseca, só pra citar alguns. Cada um me parecia tão próximo, tão necessário. Eu sentia uma forma de amizade, como se eu conhecesse cada um deles. Isso pra falar só dos mais próximos, aqui da nossa América.

Cresci um pouco mais, saí do quarto, publiquei meu primeiro livro de poemas e o destino me levou pra Feira do Livro em Porto Alegre, lugar emblemático onde o milagre aconteceu e conheci e fiquei amiga de monstros e anjos como Mário Quintana, de quem sempre falo com saudade.

Conheci também Rubem Fonseca, um dos maiores. Ali em Porto Alegre começou nossa amizade que duraria a vida inteira.

Descobri um mestre e um ser humano único, que se tornou uma das pessoas mais próximas e queridas da minha trajetória. 

Zé Rubem foi uma dos caras mais interessantes que conheci. Grande humanista, com uma visão abrangente da modernidade e do zeitgeist do seu tempo. Escreveu sobre a violência mas com um imenso sentimento de compaixão.

Meu romance Filmes Proibidos é dedicado a ele, (que praticamente me encomendou esse livro) e lembro  do dia em que ele, eu e o Ri nos encontramos em Paris para comemorar meu livro pronto, indo pra edição na Companhia das Letras.

Zé Rubem foi um amigo, um mentor com quem sempre troquei e aprendi muito. Seus livros me influenciaram, me deram asas, com seus personagens fortes, intensos, surpreendentes. Seu estilo duro, afiado, econômico e sua literatura da mais alta qualidade, que o fez conhecido no mundo inteiro.

Como atriz fiz alguns de seus personagens, na Globo e na HBO em Mandrake. Lembro dele vindo me visitar nos bastidores da filmagem e como era bom se divertir com bobagens.  

Muitas vezes a gente caminhava na orla do Leblon imaginando a vida das pessoas que passavam por nós e as histórias dentro das janelas dos apartamentos, coisa que sempre me fascinou.

Momentos que ficaram impressos dentro de mim pra sempre. Agora ele se foi e onde quer que ele esteja mando minha gratidão. Obrigada por tudo, Zé Rubem.

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